anuncio

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Non Paradisus 2ª Parte


Olá mais uma vez... Pelo visto Hugo esqueceu de checar seus bolsos há um bom tempo, não? Agora ele está lá do lado de fora do hotel imaginando, assim como nós, que tipo de lugar é aquele. Mas, eu confesso que estou mais interessado em saber o que eles vão servir no jantar...


NON PARADISUS - PARTE 2

Amassa com uma das mãos e atira longe os cigarros.
Caem perto de um poste luminoso que, para ele, não estava lá antes. No topo em letras garrafais feitas em neon vermelho está escrito, “NON PARADISUS’ HOTEL” um pouco mais abaixo, na mesma montagem, “HÁ VAGAS!” em azul.
“33B. Bem, vamos achar logo esse quarto. Pelo menos eu sei agora qual o nome daqui. Como não tinha visto aquilo antes?” Se pergunta ainda confuso, com aquele gosto na boca que começava a sair.
Hugo segue direto até seu quarto. Um quarto de hotel simples e com iluminação aconchegante. Duas camas de solteiro encostadas na parede à direita da porta, um abajur sobre o criado-mudo entre as duas.
Há uma televisão em frente às camas e, ao lado, o banheiro tão simples quanto o quarto. Pia de porcelana branca, chuveiro, privada, paredes brancas e nada a mais.
Cansado de tanto pensar o porquê faria uma reserva em um hotel esquecido em uma estrada esquecida, quantos anos tinha, o que fazia antes de tudo aquilo. Ele se senta na cama próximo ao abajur e pega um folheto do hotel que está por cima do móvel. Dizia:

“BEM VINDO AO NON PARADISUS’ HOTEL”

Aqui, cada hóspede tem um atendimento exclusivo e especial. Com um serviço de quarto único para cada um.
EXPERIMENTE O NOSSO BUFFET NA HORA DO JANTAR!!
Servimos de forma especial as nossas maravilhosas e deliciosas iguarias para todos os gostos e escolhas! Venha experimentar!

Horário das 21:00* às 23:00
DESEJO-LHES BOAS VINDAS,
Ass: O gerente
*Não realizamos serviço de quarto após esse horário

Nota um rádio relógio do lado do abajur. Os números digitais em vermelho mostram 21:45 p.m.
– Sou obrigado a ir de qualquer jeito. Maravilha! – sussurrou ironicamente pra si mesmo. Afinal, está faminto.
“Eu preciso lembrar! Eu preciso...”.
Não foi difícil de encontrar o salão. Fica bem atrás dos quartos de hotel, era grande, nada muito enorme, mas o suficiente para abrigar todos os hóspedes. Sem muitas mesas espelhadas pelo local. Só uma comprida bem no centro. A maioria ou todos os passageiros já estão lá.
Na mesa, uma enorme variedade de comida ao longo dela, cozidos, frituras, pães, saladas, doces. Tudo parece apetitoso e chamativo. Algo um tanto estranho para um hotel de quinta, Hugo imagina.
Alguns ainda comiam, outros começaram a separar seus pratos naquele instante.
Hugo senta-se do lado da ponta mais distante da entrada. Enquanto separa a comida no prato, ele olha mais uma vez ao redor e vê um homem velho e extremamente gordo sentado à sua frente com aquela mesma expressão apática de olhos vazios, devorando a comida como um animal faminto e sem modos. Os restos de frango
escorrem pelo canto da boca, junto com a gordura e o molho de macarrão respingando em sua roupa manchada! Aqueles olhos. A imagem junto com aquele olhar sem vida faz parecer que o obeso devora por uma obrigação. Um vício!
Hugo pensa em se levantar de lá. Olha ao redor mais uma vez. Tudo ocupado. Só restou continuar separando a comida no prato, “Meu Deus, parece que a comida fez algo pessoal pra ele!”. Pensa enquanto pega um bife bem passado e salada.
Muito cordial, um sujeito com grandes entradas no cabelo e gel, vestido com um uniforme preto do hotel, diferente dos outros funcionários, com certa elegância até, se aproxima até a ponta da mesa mais perto de Hugo, espera com todos os hóspedes olhem para ele e, sem se importar muito com o homem gordo se apresenta:
– Boa noite a todos! Eu sou o gerente do Non Paradisus e, podem ter certeza que cuidarei pessoalmente de que vossas hospedagens sejam inesquecíveis! – diz o gerente de pé com um largo, branco e caloroso sorriso – Eu posso garantir que o Buffet é o melhor da região. Sei que para alguns é a primeira vez que veem um lugar servir assim, mas, por favor, não se acanhem! Façam como o nosso amigo ao lado – estende a mão em direção ao velho gordo que continuava comendo ferozmente de olhos vazios.
Nenhuma risada. Nenhuma atitude. Somente os olhos sem expressão virados para o gerente, menos o do gordão. Logo o discurso foi interrompido por um outro homem que também não o encarava.
– É! É a nossa 53ª primeira vez – fala em alto e bom tom o hóspede ao fundo, olhando reto para a mesa e apertando firmemente a mão da sua mulher.
A atenção de Hugo se volta para o casal, ambos olhando fixos para a mesa, sem tentar nenhum contato visual.
Em seguida, um silêncio desconfortante toma o lugar. O gerente fixa um olhar sério, punidor diretamente no casal. Os olhares se encontram. O novo hóspede repara que os olhos do casal não estão mais vazios e sem vida, e sim cheios de medo e pavor! Um medo traumático, como se tivessem desobedecido a um pai bêbado e iriam tomar umas cintadas. Com certeza é algo pior, Hugo imagina, pois o casal se levanta e sai da mesa com os olhos vazios outra vez de um jeito sistemático. Frio.
“Tem alguma coisa errada aqui!”. Hugo queria sair dali na mesma hora, mas ficou receoso de que o mesmo acontecesse com ele. E além do mais, era só um jantar com pessoas estranhas. “Em uma estrada, quem não é estranho? Se controle. Tente lembrar...”. Mas ainda havia uma pulguinha dizendo que Hugo deveria sair dali, que lá não encontrará resposta nenhuma. “Só essa noite... Amanhã de manhã eu me mando pra primeira cidade e tento a sorte por lá.”
Com aquela estranha sensação percorrendo aos poucos e aumentando a frequência cada vez mais, ele atenta-se ao redor. Continuam olhando para o anfitrião, o único que tem expressões cordiais e brilhantes e, prossegue a conversa como se nada tivesse acontecido.
– Bom. O que mais eu posso dizer é: Desejo-lhes boas vindas e que suas estadias aqui no Non Paradisus sejam únicas! Sirvam-se desse banquete. Aposto que muitos aqui devem ter vindo de muito longe e estão famintos. Aproveitem! – diz sentando-se e começando a se servir também.
“É! É a nossa 53ª primeira vez!”
Aquilo ecoa mais e mais na cabeça de Hugo.
Lembra-se que está morrendo de fome, tão repentino quanto à vontade de fumar anterior.
Enquanto comia, Hugo pensa em como tudo aquilo era estranho. “É! É a nossa 53ª primeira vez!”. Mais um eco. Os hóspedes não emitirem sentimento nenhum. O gerente se sentar ali com os hóspedes e ser o único a ter expressões humanas. Pensa também no fato de que não é capaz de encarar o gerente por muito tempo, por mais simpático que ele fosse. Alguma coisa lhe causava repulsa naquele sorriso. E as ondas estouraram com mais força em sua cabeça.
“EU TENHO QUE SAIR DAQUI!”.
Um novo eco na cabeça.
“Tem que ser essa noite. Tem que ser!”
Terminado o jantar, Hugo se levanta e pede licença. O gerente muito educado e receptivo faz um sinal com a cabeça somente.
Mesmo com o desespero começando a tomar conta de si, ele volta ao seu quarto. Afinal ele precisa pensar um pouco.
“Preciso sair daqui! Mas por Deus! Como? Nem sei onde estou! As únicas pistas que eu tenho é uma estrada reta e vazia no meio do nada com um hotel chamado Non Paradisus que, sei lá o porquê eu fiz uma reserva! Já passam das 22:00. Está uma escuridão lá fora. Pra onde eu iria? Nem sei onde fica a cidade mais próxima. Mas qualquer lugar é melhor do que esse. Tem alguma coisa errada com aquele gerente e os hóspedes ‘É a nossa 53ª primeira vez!’ disse o homem com a esposa... O que isso realmente quer dizer?! Por que não consigo me lembrar de nada? Onde eu estou?”
Sentado na beirada da cama, com as mãos sobre a cabeça bagunçando o cabelo, ele tem a ideia de falar com o casal. Mas em que quarto poderiam estar? Não sabia.
            – O livro de entrada! – Sussurra eufórico.
            
            Fim da parte 2 de 4


0 comentários:

Postar um comentário