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quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Non Paradisus - Final



Exatamente meus caros, chegamos na parte final. Saberemos o porque nosso esquecido hóspede escolheu os serviços desse lugar. Chegamos na parte onde iremos descobrir o propósito desse macabro hotel de uma estrada qualquer que fica bem ali, próxima a Loucura.


NON PARADISUS - PARTE FINAL

Mais três batidas. Não era imaginação. Isso fez com que Hugo ficasse mais grudado na parede só encarando a porta. Passa a suar frio, ofegar como um asmático a procura de oxigênio no espaço.
Mais três batidas, agora mais fortes.
Acha que a qualquer momento irá desmaiar, enfartar. Começa a entrar em pânico! Sua cabeça a um passo de um colapso.
Três batidas! Essas pareceram que iriam derrubar todo o prédio. Mais uma e a porta não teria mais utilidade. Está quase destruída agora.
– Sai daqui! VAI EMBORA! VAI! VAI! VAI! VAI!
Não consegue dizer mais nada, além disso. Teme a morte iminente. Teme que tenha enlouquecido. Teme o hotel, o motorista, aquele casal, o gordo. Está em choque!
Do outro lado da porta, acontece o contrário. Uma voz serena, cordial e agradável responde aos gritos quase guturais vindos de dentro.
– Serviço de quarto, senhor. – disse a voz girando a maçaneta.
Hugo vê primeiro uma mão segurando uma bandeja com tampão entrando no quarto, depois o restante. O gerente! Trajando aquele uniforme preto, com o cabelo cheio de gel jogado pra trás mostrando orgulhosamente suas entradas e, como sempre, um belo sorriso sincero no rosto. Nem parecia que tinha feito algum esforço físico digno de arrombar uma porta. O hóspede não comenta nada, não consegue. Permanece grudado na parede e olha com um receio doentio o gerente. Depois dos murros, aquela calma toda assustava ainda mais o fugitivo.
– Então, senhor Hugo, o que está achando do hotel? – perguntou o gerente gentilmente – Sinto muito, mas não vejo nenhuma mesinha. Colocarei aqui do lado do abajur, tudo bem? – e sentou-se numa das beiradas da cama, olhando para o homem colado no canto do quarto.
– O que é isso?! Eu... Eu não pedi nada! Quem é você? Que lugar é esse? – ele se aproxima um pouco do gerente. Passos trêmulos. e a voz frenética.
– Achei que você já soubesse, este é o Non Paradisus. Isto entre nós, na bandeja, é o seu pedido – disse desviando o olhar e gesticulando para o objeto prateado em cima do móvel – E sim! Você pediu senhor. Foi feito exclusivamente para você. Gostaria de puxar a tampa?
– Não! Primeiro eu quero saber exatamente onde estou! Não consigo lembrar nada! – quase em prantos ele se senta na beirada da outra cama, ficando de frente para o funcionário do hotel.
– Acalme-se, sim? Eu sei que não se lembra. Muitos nunca lembram. Mas com você serei legal! Nunca vi ninguém correr tanto! – o gerente da uma risada lembrando a situação – Então, aceite o seu pedido que você se lembrará. Por favor, sim?
O gerente olha para ele até ser olhado de volta. O mesmo olhar que usou no casal.
Hugo esta fora de seu controle. Estica o braço em direção à bandeja. Sabe exatamente o que esta fazendo, só não consegue parar. Não quer parar. Está dominado por uma curiosidade anormal sobre o que há debaixo daquele tampão prateado e bem lustrado.
Só de ter visto o que há na bandeja, lapsos de imagens tão fortes lhe vem à mente. Tão fortes que vacila e quase cai no chão. Esfrega os olhos repetidamente como se fosse tirar as visões horrendas que passam diante de seus olhos. Corpos completamente esquartejados, banhados em sangue com os músculos dos rostos retorcidos de tanta dor e medo que sentiram em seus últimos segundos de vida.
Está quase vomitando, seu estômago começa uma guerra pelo sim e pelo não. O sim vence e o chão é forrado!
– Oh! Que bom! Vejo que começou a se lembrar, senhor Hugo. Excelente! – comenta o gerente entusiasmado.
– Lembrar?! Lembrar do que? O que você está fazendo? Quem é você?
– Oras, Hugo. Posso chamá-lo assim? Está se lembrando quem é você, simplesmente. Eu não fiz nada. Quem fez isso foi você, só você. Estou tentando te ajudar a lembrar das coisas somente. Eu sou...
Logo foi interrompido de seu discurso gentil e amigável.
– Eu não faria nada assim! Nunca! Não sou nenhum assassino!
– Temo em discordar do senhor, mas sim. Você é. Até tentou alegar insanidade para fugir da cadeira elétrica, é, pelo visto, você fez muitas coisas malvadas. – diz o gerente esboçando um sorriso pela leve brincadeirinha.
– Estou foragido então? Acabei de fugir de um hospício, é isso? E como você, um gerentezinho de merda de um hotel de bosta como esse tá sabendo disso? – questiona o hóspede começando a ficar furioso e pronto para outra investida. – Vamos diga!
O gerente olha para a cara do pobre coitado e cai na gargalhada.
– Não. Não Hugo, meu amigo. Você não é um foragido. Eu disse que você tentou alegar insanidade, não que havia conseguido – responde rindo mais alto ainda, logo para e recupera o fôlego para prosseguir – Não sou um simples gerente, pobre criatura. Vocês já me deram muitos nomes. Muitas figuras. Esse também não é um simples hotel.
Hugo só encara o gerente com um olhar perdido de dúvida sem entender nada mais do que acontecia. Só sabe que está completamente perdido.
– Eu sou aquele que está nos detalhes. Sou aquele que vocês temem em mencionar um dos meus muitos nomes. Você me conhece como Lúcifer.
Ao ouvir, as pernas de Hugo faltam. A respiração ofegante e o desespero voltam.
– Não! Não é possível! É um pesadelo! É só um pesadelo! Eu não morri, eu não morri – dizia repetidas vezes. Sua cabeça começa a entrar em parafuso de novo tentando ignorar todos os fatos anteriores.
– É mais real do que você pensa meu caro... Você morreu. Depois de 15 vítimas de seu sadismo doentio, você foi pra cadeira elétrica e apareceu na embarcação de Caronte. Agora, por favor, pegue a sua arma predileta que você usava nas suas brincadeiras. – percebe que o ouvinte não entende – essa na bandeja!
Estava mais calmo agora. De repente essa calma veio. Desconfiou ter sido influenciado, mas não liga. Está se questionando sobre Caronte.
– Isso mesmo meu bom hóspede! É do Nortace que estou falando. Eu sei o que você pensa, posso ler. E me lembro do quanto você adorava fazer esses anagramas e mandar para polícia só pra se divertir. Agora eu vou me divertir com você! – finaliza Lúcifer.
Só resta agora à Hugo, suplicar. Clama por piedade, pela sua alma, ficando de joelhos na frente de um ser inominável e, ao mesmo tempo, de muitos nomes. Ainda não lembra muita coisa, mas já sabia exatamente onde estava.
– Piedade?! Acho vocês, seres humanos, muito engraçados! Eu aposto que seus semelhantes te falavam a mesma coisa, mas você teve piedade? Não, certo? Então, por que eu, a maldade pura, teria? – faz uma pausa, respira e prossegue – Sabe aquele gordo sem requintes na janta que não parava de comer?
Hugo balança a cabeça concordando.
– Ele não teve piedade das criancinhas que sequestrava nas portas das escolas e depois da violação as devorava literalmente para me cultuar! Cultuar! Nunca pedi nada assim. Vocês foram a criação mais ridícula que eu e meu irmão fizemos. Colocam a culpa em um Bem ou Mal supremo para justificar as atrocidades bizarras que fazem uns com os outros. Guerras por religião, política. Assassinatos. Linchamentos. Estupros. Armas de destruição em massa. Isso é somente exclusividade de vocês. Nunca vi uma espécie tão sádica e hipócrita a ponto de culpar algo que nem ao menos compreendem. Vocês decepcionaram meu irmão profundamente. Nunca mais governou a Dimensão como antes, e sei por quê. Agora pegue esse punhal, sua criatura podre!
O ser de vários nomes olhou hipnoticamente para o maníaco a sua frente.
Sabe o que está fazendo, tem noção de tudo, mas simplesmente não consegue controlar as ações do corpo. Sente náuseas e chegar a pensar que seu braço treme de tanto medo do que está por vir, mas são só sensações. Seu corpo foi tomado pela mente do Inominável.
Como uma corrente elétrica de milhares de Volts, todas as lembranças das últimas horas de vida de cada vítima que perseguiu foram transmitidas do punhal direto ao cérebro. Toda a angústia, agonia, violação, desesperança, dor, principalmente a dor percorrem o corpo, cada nervo reagindo agudamente.
Ali. Jogado no chão gritando e se contorcendo feito um animal envenenado, ele tenta implorar para que acabe, que a tortura pare, engasgando no próprio sangue imaginário.
– Han! Han! Isso ainda não acabou. – diz o gerente balançando o dedo indicador negativamente com o sorriso simpático e sarcástico.
As dores e as visões param. Ele respira um pouco até notar que seu braço está formigando, e com alguns espasmos involuntários e ficando cada vez mais rígido e insensível. O braço não respondia mais a nenhum comando vindo da mente de Hugo, mas por aquele punhal.
Seu favorito punhal tomou conta de todo o membro, começando a atacá-lo. Não podia fugir de sua própria mão. Por mais força que fizesse contra, o braço possuído era mais forte. Mesmo assim, luta contra ele. Tenta afastar a lâmina de seus órgãos.
Um enorme esforço desperdiçado!
O assassino enfia o punhal, exibindo suas entranhas, abrindo rasgos em seu corpo como se fosse um pano qualquer. A dor. A dor real aparece fazendo-o vomitar nada além de sangue. Real dessa vez. Sangue e dor de 15 malditas vítimas!
Torce para que tudo aquilo acabe rápido, admite para si mesmo que errou. Que se arrependeu dos crimes. Mas no Inferno, como a Maldade Pura poderia ter piedade? Seu corpo reconstituía perfeitamente em questões de segundos e o braço continua possuído pelo punhal, pronto para fazê-lo sentir novamente a lâmina fria penetrando e queimando a carne profana de um assassino.
O Gerente de Muitos Nomes observa sentado na beira da cama mais um hóspede do Non Paradisus’ Hotel aproveitando o especial serviço de quarto feito exclusivamente para cada hóspede.

2 comentários:

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    1. Gostou mesmo? Muito obrigado! logo mais postarei mais contos... te convido a acompanhar o blog e deixar sua opinião sobre as postagens

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